Karine Kavalco, Setembro de 2003.
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Aspectos históricos
As primeiras idéias sobre cromossomos surgiram no fim do século XIX, quando os primeiros estudos sobre mitose foram realizados. Em 1866, Haeckel propôs que o núcleo celular era o principal agente responsável pela divisão das células. O primeiro cientista, entretanto, a descrever o processo da divisão celular mitótica de forma clara foi o zoólogo alemão Anton Schneider, em 1873.
Posteriormente, outros pesquisadores ampliaram os estudos sobre mitose. Contribuições importantes foram dadas por Strasburger, em 1875 e por Flemming, de 1879-1882, este último o responsável pelo termo "mitose". A partir disso, a divisão mitótica foi melhor compreendida em animais e vegetais.
Em 1880, Balbiani descobriu a existência dos cromossomos politênicos do díptero Chironomus, bastante comuns em insetos. Em 1881, Flemming descobriu os cromossomos plumosos nos ovócitos do anfíbio Siredon.
Embora os estudos com cromossomos tenham se tornado freqüentes, a idéia de que estavam envolvidos com herança somente surgiu em 1887, nos trabalhos de Weismann, que os introduziu na teoria de herança. Esta incluía os seguintes pontos:
1. A "substância nuclear" controla a forma e a função de cada célula, e se divide (mitose) gerando produtos iguais a si. 2. Ovos precisam perder metade da sua "substância nuclear" no corpúsculo polar antes da fertilização, e precisam ser completados com exatamente a mesma quantidade de "substância nuclear" proveniente do espermatozóide. 3. Pelo fato de a reprodução sexuada depender da junção dos núcleos do ovo e do espermatozóide em cada geração, é preciso que a "substância nuclear" das células germinativas de ambos, macho e fêmea, tenham sido reduzidas à metade. (Esta proposição foi formulada depois do entendimento do processo da meiose). 4. Não há diferenças substanciais na "substância nuclear" de células de ovos e espermatozóides. 5. A reprodução sexuada pode ser entendida como produtora de variabilidade entre os indivíduos, onde a seleção natural pode atuar.
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A Teoria de Weismann considera todos estes pontos (passíveis de observação na natureza), mesmo tendo sido formulada com total ignorância das leis de Mendel. Estas foram redescobertas apenas em 1900, por três cientistas: Correns, de Vries e Tschermak, em uma série de estudos de citologia. Com o renascimento das leis de Mendel, surgiu a Teoria da herança cromossômica, que relaciona os cromossomos com as leis mendelianas de herança.
Este foi um marco para o estudo dos cromossomos, onde a citologia e a genética passaram a sobrepor seus conhecimentos numa área posteriormente denominada Citogenética.
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Os cromossomos e o DNA
Na grande maioria das vezes em que é observado o termo cromossomos, este está relacionado com cromossomos mitóticos metafásicos de eucariotos. Entretanto, muito da nossa informação sobre a estrutura e os mecanismos de replicação do DNA veio de estudos em procariotos.
Os procariotos são monoplóides, enquanto muitos dos animais e vegetais superiores são diplóides, tendo dois conjuntos de genes, um de cada progenitor. Há também várias plantas poliplóides, carregando várias cópias do genoma. A informação genética da maioria dos procariotos é armazenada em um único cromossomo. Além dos eucariotos excederem em muitas vezes o número de cópias do genoma quando comparados aos procariotos, este DNA também está organizado em vários cromossomos e estes cromossomos podem estar presentes na célula em duas (diplóide) ou várias (poliplóide) cópias. A citogenética tem como objeto de estudo principal os cromossomos de eucariotos.
Os cromossomos de eucariotos são organizados de maneira particular. Na composição química da cromatina constam proteínas, DNA e RNA (este último em menor quantidade). As proteínas são de duas classes: (1) proteínas básicas, chamadas histonas; e (2) proteínas ácidas, chamadas de proteínas cromossômicas não-histônicas. As histonas desempenham um importante papel na estruturação do cromossomo. Tanto que sua proporção no núcleo é de 1:1 (peso/peso) em relação ao próprio DNA. Cada cromossomo é uma molécula de DNA.
A estrutura da cromatina dos eucariotos é composta de subunidades repetidas chamadas nucleossomos. Estes consistem de um segmento de DNA de 146 pares de nucleotídeos de comprimento, enrolado em torno da superfície um tanto cilíndrica do octâmero de histonas, produzindo uma estrutura aproximadamente elipsóide.
Pelo menos cinco níveis de condensação são necessários para empacotar o DNA no cromossomo de eucariotos em uma estrutura metafásica de poucos micros de comprimento, como indicado na figura abaixo:
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1. O primeiro envolve o empacotamento do DNA como uma espiral em nucleossomos de aproximadamente de 10nm de diâmetro. Este passo envolve um octâmero de histonas (b).
2. O segundo envolve a estrutura de solenóide, um segundo nível de epiralamento, produzindo uma fibra de 30nm (c).
3. O terceiro são os "loops" de solenóides, ligados a um esqueleto central protéico. Esta estrutura tem aproximadamente 300nm de diâmetro (d).
4. O quarto são "loops" do esqueleto protéico, formando uma estrutura gigante, super enrolada, com 700nm (e).
5. Por fim, na sua máxima condensação, a cromátide cromossômica conta com cerca de 1400nm de diâmetro (f).
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Estrutura e tipos de cromossomos
O cromossomo metafásico típico é formado por duas cromátides irmãs, uma delas oriunda do processo de duplicação da cromatina. As cromátides se encontram presas por um região delgada, chamada constrição primária ou centrômero. O centrômero divide a cromátide em dois braços cromossômicos, ou pode estar localizado na região terminal de um braço, formando um cromossomo com um braço apenas. Em alguns cromossomos pode ser visualizada ainda uma constrição secundária, outra região de condensação diferenciada no cromossomo. O segmento seccionado pela constrição secundária e anterior ao telômero(extremidade dos braços cromossômicos) é conhecido como satélite.
A maioria dos cromossomos são monocêntricos, ou seja, possuem um centrômero apenas. Na natureza podem ser encontrados cromossomos dicêntricos, tricêntricos, acêntricos, etc. Os cromossomos acêntricos (sem centrômero) geralmente são perdidos durante a divisão celular, uma vez que no centrômero está o cinetócoro, estrutura responsável pela fixação das fibras do fuso, as quais direcionam os cromossomos durante o ciclo celular. Os cromossomos com mais de um centrômero são passíveis de quebras, uma vez que as fibras do fuso mitótico podem direcionar as cromátides de maneira aleatória. Entretanto, estes cromossomos podem ser mantidos na natureza por meio de um mecanismo de inativação de um dos centrômeros ou de alguns centrômeros. Estes passam a ser chamados de centrômeros latentes. Quando as fibras do fuso se ligam na extensão da cromátide, o cromossomo é chamado holocêntrico, por não possuir uma única região centromérica.
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Com base na localização dos centrômeros são feitas as classificações dos tipos cromossômicos. Um exemplo é a classificação de Levan et al. (1964), que considera 4 tipos cromossômicos em relação à razão de braços. A razão é calculada dividindo-se a medida do maior braço (q) pela do braço menor (p):
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TIPO CROMOSSÔMICO
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RAZÃO DE BRAÇOS
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metacêntrico
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RB = 1,00 - 1,70
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submetacêntrico
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RB = 1,71 - 3,00
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subtelocêntrico
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RB = 3,01 - 7,00
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acrocêntrico
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RB > 7,01
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cromossomo metacêntrico
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cromossomo submetacêntrico
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cromossomo acrocêntrico
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As constrições secundárias também são regiões particulares dos cromossomos. Nelas geralmente estão as Regiões Organizadoras de Nucléolo (RONs). Nas RONs estão localizados os genes responsáveis pela produção de rRNAs, os quais constituem parte do nucléolo. A sua importância está em justamente produzir e processar os RNAs necessários para sintetizar todas as proteínas da célula. Os genes ribossômicos estão presentes em múltiplas cópias no genoma, ou seja, é um tipo de DNA repetitivo.
Os telômeros possuem seqüências próprias de DNA, conservada em várias espécies, com algumas poucas exceções. Em muitos eucariotos os telômeros consistem de repetições de um hexanucleotídeo: TTAGGG, mas uma variedade de outras pequenas seqüências curtas têm sido observadas em algumas espécies. Estas repetições tem um papel importante na conservação da estrutura do cromossomo. Isso acontece porque a cada ciclo celular, em que o cromossomo é duplicado, não é possível chegar ao fim da molécula de DNA. A repetição desta seqüência de bases evita o encurtamento indefinido, que pode excluir do cromossomo genes ativos. Esta região também não é suscetível ao ataque de nucleases.
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A partir da forma e do número de cromossomos de uma espécie, é estabelecido seu cariótipo. Sobretudo os cromossomos mitóticos, em fase de metáfase, são utilizados para a descrição do cariótipo da espécie. A representação do cariótipo pode ser um cariograma (imagem dos cromossomos) ou um idiograma (esquema dos cromossomos), e é ele quem fornece as informações substanciais para o estabelecimento das relações entre espécies, com respeito à organização dos cromossomos. Além das colorações ditas como convencionais (Giemsa, Orceína Acética, reativo de Schiff, hematoxilina/eosina, etc.), podem ser aplicadas nos cromossomos metodologias que identificam "bandas". Os bandamentos (C, G, Q, R, Ag-RON) são importantes para a identificação de cromossomos homólogos e homeólogos, e na caracterização de polimorfismos ou de relações de parentesco entre espécies próximas, distinguindo possíveis rearranjos cromossômicos. Mais recentemente, com a advento de diversas técnicas em Biologia Molecular, a citogenética tem acumulado refinamentos, sobretudo os relacionados com a localização de genes ou de seqüências de DNA repetitivo. Estes estudos são possíveis com as Hibridações Fluorescentes in situ, ou FISHs. Além destas, a hibridação de genomas inteiros, através de GISH (Hibridação Genômica in situ), tem fornecido interessantes dados sobre o estudo de híbridos e espécies proximamente relacionadas.
Bibliografia Consultada
Guerra, M. (1988). Introdução à Citogenética Geral. Ed. Guanabara Koogan: Rio de Janeiro-RJ. 142p.
Sumner, A.T. (2003). Chromosomes - Organization and Function. Blackwell Publishing: United Kingdon-UK. 287p.
White, M. J. D. (1977). Os Cromossomos. Companhia Editora Nacional, São Paulo – SP. 196p.
Fonte: biociencia.org
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