O VEADO (Cervus Elaphus)
Na sua proliferação espacial ao longo de milénios, os veados aproveitaram-se da existência de um continente único ( Pangêa) para se difundirem através de todo ele. Mais tarde com a separação das diferentes placas continentais que originaram os actuais continentes, o veado adaptou-se às características de cada biótipo e originou várias subespécies, todas elas derivadas do mesmo padrão biológico. É o caso do Wapiti (Elk), do Cervo Mulo (Mule Deer), do Cervo de Cauda Branca (White Tail Deer) existentes ao longo de todo o continente americano, para referir apenas algumas subespécies existentes.
Na Europa as subespécies são, para além do padrão original, o gamo e o corço, as quais revelam características físicas e comportamentais muito semelhantes à do Cervus Elaphus.
E na origem do aparecimento das diferentes subespécies esteve (mais uma vez segundo Darwin) a capacidade de adaptação do nosso veado. Preferindo as zonas florestadas ou de coberto vegetal denso, onde tem protecção contra o clima e a alimentação variada que necessita como herbívoro ruminante, encontrou no bosque mediterrânico da península ibérica e nas matas florestais da Europa Central o biótipo ideal para a sua fixação e desenvolvimento. Este mamífero atinge um peso bruto médio, em vivo, de cerca de 150 kg na Europa Ocidental podendo este valor atingir os 300 kg nos países da Europa Central e de Leste. Aliás, no que se refere às diferentes espécies de caça maior, o factor clima e consequentemente os factores qualidade e disponibilidade de alimento fazem com que a corpulência dos diferentes animais aumente progressivamente à medida que, no espaço Europeu, se caminha para Oriente. Vive em média cerca de 15 anos e atinge a maturidade sexual por volta dos 16/20 meses de idade. As fêmeas parem, normalmente, uma cria por ano, não sendo raras as parições gémeas; contudo, a taxa de sobrevivência dos gémeos e bastante baixa quando comparada com a das crias únicas.
Apesar da sua capacidade de adaptação esta espécie é também muito sensível ás condições fitossanitárias, sofrendo intensamente as consequências de uma alimentação insuficiente ou sem qualidade. Os animais perdem peso com muita facilidade, tornam-se débeis e padecem das maleitas mais vulgares dos animais bravios - parasitismos internos e externos, tuberculose, etc . A recuperação destes desequilíbrios é por sua vez lenta e deixa, frequentemente, sequelas irreparáveis. Estes factores do meio reflectem-se na qualidade dos troféus: uma população cervídeos confinada a uma área fechada em que a alimentação seja insuficiente ou deficiente, nunca terá animais com troféus de qualidade.
Outra condicionante da qualidade dos troféus, esta frequentemente esquecida pela maioria dos gestores de caça, é a consanguinidade. Este factor é frequente nas áreas fechadas onde as populações se reproduzem, anos a fio, através de animais do mesmo sangue. Para superar esta condicionante recomenda-se a introdução de novos indivíduos (machos e ou fêmeas) provenientes de regiões diferentes da origem dos primeiros indivíduos, a cada 5 anos. Por outro lado, dado a mobilidade da espécie, em zonas abertas este factor não actua, sendo de descorar a sua influência na qualidade dos troféus.
Os veados evidenciam ainda um carácter gregário, patente na constituição de grupos sociais separados por sexos. Os machos juntam-se em grupos de indivíduos de diferentes idades, enquanto as fêmeas se reúnem em grupos familiares mais ou menos extensos, constituídos pelas mães e respectivas crias do ano e ano anterior, liderados pela cerva mais velha, a qual conduz e protege o grupo.
Em Portugal, a espécie esteve extinta - em zonas abertas - durante os primeiros 3/4 do século XX. As poucas e raras observações de veados, em terreno livre (assim se designou até à bem pouco tempo), ocorriam em zonas fronteiriças com Espanha ( Bragança, Castelo Branco e Barrancos), enquanto nalgumas áreas muradas os exemplares existentes e até então aí conservados definhavam à mingua de gestão, de alimento em qualidade e de sobredensidade. No entanto, na vizinha Espanha, a espécie esteve sempre presente e o veado foi a principal captura de caça maior ao longo de todo o século passado, fosse em Montaria fosse em caça de aproximação ou eventualmente de espera.
Enquanto espécie de caça, o veado fez e satisfez as emoções de milhares de caçadores, primeiro pela qualidade da sua carne e depois pelo tipo e qualidade do seu troféu. Volta a salientar-se que a caça maior é, fundamentalmente, uma caça de troféu e não uma caça de abastecimento de carne. E sobre este assunto cabe fazer a distinção entre os países da Europa do Norte ( Noruega, Suécia, Finlândia e Dinamarca) e os da Europa Central e do Sul. Para os primeiros a caça maior constitui uma fonte primordial de alimentação (baseada no armazenamento temporário para consumo próprio), acima de tudo por questão cultural e de gestão de recursos naturais disponíveis, (mas também porque nestes países a caça é propriedade do dono da terra e há neles um respeito enorme pela propriedade privada), e nos segundos a importância é posta na qualidade do troféu e no acto de caça, pelo que o valor comercial pende para a vertente turística. Nos países do Norte, o valor da carcaça do animal caçado é bem superior (felizmente para nós turistas cinegéticos) ao valor que cobram ao caçador pela sua taxa de abate. No resto da Europa a carne, actualmente, pouco ou quase nenhum valor tem e a qualidade do troféu é paga (taxa de abate) a peso de ouro. E este modelo turístico é característico dos continentes europeu e africano, enquanto que no continente americano (Canadá, América do Norte e Central e América do Sul) se adopta um modelo misto de caça de troféu (para turismo cinegético) e de consumo de carne na prática da caça não comercial.
Em Portugal, a caça ao veado tem um valor comercial e emocional elevado. Os processos de caça a esta espécie são, fundamentalmente, a Montaria - aqui o valor comercial dos postos duplica quando se pode atirar aos veados - e a Aproximação, normalmente destinada á caça de troféus na época da brama (cio) - e nesta os valores por unidade animal cobrada são ainda mais elevados. Estes factos levam-nos a considerar cuidadosamente a evolução do troféu (só existente nos machos, repete-se), tal como a observação no campo e no momento de caça já que, de acordo com a posição em que o animal se encontra, se torna mais fácil ou difícil a sua apreciação e julgamento (são vulgares os erros de julgamento, quando não se tem muita experiência nesta área).
LEGENDA
1 - Tronco Principal ; 2 - Coroa; 3 - Estoque; 4 - Contraestoque; 5 - Ponta Intermédia; 6 - Pivot; 7 - Roseta; 8 - Tronco
a e b - 1ª Cabeça (Vareto); c e d - 2ª Cabeça; e, f e g - 3 ª Cabeça; h - 4ª Cabeça; i - 5ª Cabeça; j - 6ª Cabeça
A imagem acima apresenta a constituição e a evolução do troféu do veado escalonado pelas diferentes classe de idade. Assim, quando se indica uma "2ª cabeça" estamos a referir-nos a um animal de 3 anos de idade. No primeiro ano de vida a identificação do sexo dos jovens torna-se muito difícil já que as pequenas hastes dos machos apenas se tornam visíveis entre os 8 e os 12 meses, sendo que a "primeira cabeça" identificável só se observa a partir de um ano de idade. Nestes termos uma primeira cabeça corresponderá, no mínimo, a ano e meio de de vida do animal. Atente-se no facto das hastes dos cervídeos terem a particularidade de, todos os anos, caírem ( Fevereiro/Março) e voltarem a crescer num espaço de tempo muito curto (cerca de 4 a 5 meses, dependendo da condição física e sanitária dos animais).
Face ao que se referiu, importa salientar que qualquer veado só terá um troféu de qualidade a partir dos 9 ou10 anos de idade. Apesar do crescimento das hastes atingir a sua envergadura total por volta dos 6 anos, os tempos vindouros proporcionarão ao veado um engrossar progressivo dos troncos das hastes bem como um possível aumento do número de pontas na coroa.
E como se determina exactamente a idade de um veado?
Tal como a Biologia refere esta determinação só é real e exacta através da análise dos sedimentos de crescimento dos dentes molares do animal. Para tal seria necessário extrair o dente e cortá-lo longitudinalmente para, através de uma lupa binocular, se poderem observar os sedimentos depositados em cada ano ( oito estratos = a oito anos). Por outro lado, existe um outro processo de resultado aproximado, e que nos permite conhecer, não a idade exacta do veado, mas pelo menos a sua classe de idade: se é jovem (até 3-4 anos de idade) se é adulto (4 a 10 anos de idade) ou se é maduro (mais de 10 anos de idade). Trata-se da apreciação dos desmogues (hastes que os veados perdem todos os anos) encontrados no campo e correspondente análise dos seus pivots.
Sobre a sua caça, remetemos os visitantes para o que se mencionou na caça de Aproximação (por ser esta a mais adequada e usada para a obtenção de veados de troféu) e na Montaria ( sendo este o segundo processo mais utilizado). Convém apenas deixar uma referência às marcas de presença, para facilitar a quem anda no campo a identificação dos sinais de existência destes animais.
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